Inglaterra e Brasil surpreendem com a produção de espumantes de qualidade

Por Mikaela Paim*

Como mencionei na minha coluna de estreia, o espumante é uma das bebidas preferidas da Rainha Elizabeth II, sempre presente nos grandes jantares e banquetes.

E quando o assunto é produção de qualidade, o Brasil e a Inglaterra têm um aspecto em comum: nos últimos 30 anos, os dois países vêm se destacando internacionalmente e até chamando a atenção da região de Champagne, pela excelência em seus produtos.


Para entender, vamos fazer uma viagem ao passado e começar com a história do vinho inglês. Sua primeira evidência de plantio foi no ano 1 d.C., dando sequência desde os romanos à Idade Média. Porém, os séculos XVI e XVII favoreceram a decadência da fabricação local, devido à intensa importação de vinhos europeus. E desde então, não houve nenhuma produção relevante.


A nova era dos vinhos modernos sempre foi descrente em relação ao potencial inglês para vinhos de qualidade, devido suas típicas condições climáticas, com baixas temperaturas e clima chuvoso, de curtos verões e prováveis geadas durante o floreio e colheita, somados à sua localização fora das características ditas ideias para o plantio. Tanto que no passado se tornaram motivo de descrença no mundo do vinho.


A partir da década de 50 que a viticultura Inglesa renasce, ainda com uma tímida produção, porém contínua, de vinhos tranquilos, produzidos com uvas de origem alemã. Nos últimos 30 anos, o cenário progride com um investimento milionário de diversos banqueiros, advogados corporativos e profissionais do setor de finanças, que abandonam suas carreiras para investir na vida no campo e na arte de fazer vinhos e espumantes de qualidade.


Foi no final da década de 1980 que um casal de Chicago foi pioneiro no plantio de uva, rainha das castas brancas, Chardonnay, ao lado das clássicas Pinot Noir e Pinot Meunier em West Sussex, fundando a vinícola Nyetimber, já com a proposta de serem os primeiros a fazer vinho espumantes à altura dos Champagnes.


Outra história de sucesso que me chama a atenção: o ex-bancário Nicholas Coates conta não ter saudades de sua antiga vida, que diariamente, às 5:41 da manhã, tomava o trem para Londres e só voltava para a sua mansão no interior de Hampshire por volta das 22:30, rotina que se repetiu até seus 47 anos, até 2007, quando anunciou à sua família e amigos a vontade de largar tudo e ir  viver no campo, fazendo espumantes melhores que Champagne. 

Em 2008, se associou a um antigo amigo, Christian Seely, e juntos fundaram a Coates & Seely, com uma “crença inabalável e um desejo ardente de fazer, um dia, um vinho espumante que rivalizasse com os melhores do mundo”. Atualmente, Coates só precisa atravessar um roseiral que separa a sua residência da sede da vinícola.


Uma década depois, os espumantes Coates & Seely são listados em palácios reais, restaurantes com estrelas Michelin, ganharam medalhas de ouro e troféus em todas as principais competições de vinho nacionais e internacionais. Em 2017, os seus vinhos foram eleitos o Melhor Vinho Global, o Melhor Vinho Espumante, o Melhor Blanc de Blancs e o Melhor Espumante Rosé do Reino Unido (UK Wine Awards, 2017). Eles ainda são os únicos vinhos ingleses a serem listados no George V em Paris. Em 2019, o espumante Coates & Seely 2009 La Perfide derrotou rivais franceses e levou um troféu na International Wine and Spirit Competition (IWSC).


E esse é apenas um dos cases de sucesso, que ajudaram a mudar o cenário viticultor da Inglaterra, como sérios candidatos nas competições dos melhores vinhos do mundo.


Com uma análise profunda e científica do terroir local, constataram condições ideias para um plantio de excelência, como solo de concentração calcária, uma similaridade importante com a região de Champagne, em Reims na França, o que já deixou os franceses ainda mais alertas quando, segundo a empresa de análise de mercado Mintel, o consumo de Champanhe no Reino Unido caiu em um terço e o produto local em constante alta exponencial: “A melhoria da qualidade e a comparação de preços favoráveis de vinho espumante criam problemas para as marcas de Champanhe”, explica o analista Chris Wisson.

E o Brasil, assim como a Inglaterra, tem despontado em sua produção de excelência com diversos reconhecimentos internacionais, inclusive se tornando apreciado em solo inglês. “Os rótulos brasileiros são uma boa surpresa para os britânicos”, conta Alex Davies, comprador da Virgin Wines. Atualmente, oito vinícolas brasileiras exportam para o Reino Unido. 
Outra similaridade com a produção premiada e de qualidade no Brasil é o fato de áreas, antes ditas impossíveis para a produção de uvas, hoje fazem sucesso internacional, como é o caso da fabricação de vinhos no Nordeste. Surpresos? Quanto à qualidade e diversidade de vinhos do Brasil, convido a acompanharem minha próxima coluna. Até lá, saúdo a todos com uma boa taça de espumante brasileiro!

* Mikaela Paim é brasileira, sommèliere de vinhos e única empresária brasileira especialista em todos os tipos de bebidas, azeites e charutos. Com mais de 15 anos de carreira na área gastronômica, é reconhecida em todas as áreas que atua, além de ser jurada, avaliadora dos principais campeonatos e especialista em técnicas multissensoriais. mikaelapaim@gmail.com

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